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02 outubro 2010

O direito à terra!


Assim como todo ser humano tem direito ao ar que respira, tem também direito à terra, às ferramentas para trabalhar na roça, e um local para vender seus produtos. Com as mudanças surgidas no campo, a concentração fundiária e a mecanização da agricultura, grande parte da população foi expulsa do campo e migrou para as cidades, buscando emprego e uma vida melhor. O final do século XX e o começo do século XXI formam o primeiro período da história no qual existe mais gente morando nas cidades do que no campo, em todo o mundo. A desorganização das formas tradicionais da economia agrária e o processo de industrialização atraíram milhares de pessoas às cidades, em busca de emprego e novas possibilidades de sobrevivência.

O MST é um dos principais movimentos sociais que hoje luta pelo direito à terra no Brasil (mas existem vários outros a exemplo da CPT). Suas ações são muitas vezes mostradas como violentas e radicais pelos grandes jornais e pelos canais de televisão, mas é a forma de ação política que eles escolheram – principalmente por entender que não é possível esperar de braços cruzados a ação dos governos para realizar a reforma agrária.

Há um entendimento no MST que o direito à terra será realizado através da mobilização e trabalho da população que precisa da terra: os camponeses expulsos do campo, as pessoas que não conseguem emprego nas cidades etc. O direito à terra, na visão do MST, tem várias frentes, como os assentamentos já legalizados, os acampamentos à beira da estrada das pessoas esperando para ser assentadas, e também as ocupações de fazendas improdutivas, para forçar a desapropriação e a criação de novos assentamentos.

O MST também tem ações que pouco aparecem nas mídias, mas que são muito importantes: os assentados sempre procuram se organizar em cooperativas para melhorar sua produção rural; os assentamentos (e mesmo os acampamentos) têm programas específicos de saúde e educação (que são elogiados até pelo governo e organizações internacionais); as Marchas Nacionais pela Reforma Agrária, rumo à Brasília, também são importantes para simbolizar a luta por justiça social no campo - o movimento reivindica do governo, além de maior agilidade na reforma agrária, mais crédito para a agricultura familiar e uma organização econômica que melhore a distribuição de renda no País.

Muitas pessoas criticam e discordam de ações do MST, mas é difícil negar que o movimento dá uma contribuição importante em prol do direito à terra no Brasil.

Conflitos no campo também ocorrem entre comunidades tradicionais (indígenas, quilombolas, ribeirinhos, caiçaras) e os grandes proprietários de terras. Ao contrário do que aparece nos grandes jornais e na tevê, alguns dos maiores conflitos não são entre os trabalhadores sem terra e essas comunidades tradicionais, mas entre as comunidades tradicionais, de um lado, e os grandes proprietários de terra, do outro.

Pela Constituição Federal de 1988, indígenas e quilombolas deveriam ter suas terras demarcadas pelo Governo Federal. Infelizmente, isto ainda está distante de ser uma realidade. Com relação aos povos indígenas, o artigo 231 da Constituição Federal garante a demarcação, e o decreto nº 1.775, de 1996, trata sobre os procedimentos administrativos de demarcação das terras indígenas.
A demora para a demarcação das terras indígenas e a pressão de grandes latifundiários contra a criação de reservas geram diversos conflitos, a exemplo da situação das terras indígenas Guarani-kaiowá onde várias comunidades foram expulsas por fazendeiros de suas áreas de ocupação tradicional; encontram-se acampadas em beiras de estradas em situação precária. Os conflitos culminaram no assassinato de várias pessoas.

Ver filme: Terra Vermelha, de Marco Bechis. Assista ao trailer:

Colocamos à disposição para um público mais amplo dois vídeos que de alguma forma se relacionam com as questões aqui apontadas. O primeiro mostra comunidade Guarani-Mbya sendo expulsa pela Justiça Estadual em Eldorado (RS), com apoio Brigada Militar, de um acampamento situada à beira da Estrada do Conde, município de Eldorado do Sul, próximo à cidade de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul. Isso aconteceu no dia primeiro de julho de 2008.


O segundo vídeo trata do cotidiano das crianças Guarani-Kaiowá que vivem acampadas às margens da BR 163, após “despejo” ocorrido em setembro passado da área que forma hoje a Fazenda Santo Antônio da Boa Esperança, em Rio Brilhante, Mato Grosso do Sul. A matéria foi veiculada na TV Campo Grande (SBT-MS):


Comunidades quilombolas em diversas regiões do país vivem situações semelhantes às dos povos indígenas. De acordo com a Constituição Brasileira, o art.68, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias diz textualmente que:

Aos remanescentes das comunidades dos quilombos que estejam ocupando suas terras é reconhecida a propriedade definitiva, devendo o Estado emitir-lhes os títulos respectivos. E o Decreto 4887 de Novembro de 2003: Regulamenta o procedimento para identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas por remanescentes das comunidades dos quilombos de que trata o art. 68.

Em fevereiro de 2008, o decreto 6040 estabeleceu a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais. Apesar da política do governo federal ser explícita ao dar importância para o reconhecimento e fortalecimento dessas comunidades, a realidade para os quilombolas tem sido bastante dura, devido à ação da bancada ruralista. Mas há uma luta e resistência constante da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Quilombolas, com o apoio da Comissão de Direitos Humanos e Minorias do INCRA (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), da Confederação Nacional da Agricultura, da Fundação Palmares – que participa do processo de titulação das terras.


Fonte: Material do curso à distância: Direitos Humanos e Mediação de Conflitos

01 outubro 2010

Dia Mundial do Idoso: mais velhos ampliam presença no mercado de trabalho


No Dia Internacional do Idoso, comemorado dia 1 de outubro desde 1999 a partir de resolução da ONU, uma ótima notícia: o mercado de trabalho está de braços abertos para receber essa parcela da população. Em 2009, no mercado de trabalho, havia mais de 320 mil trabalhadores com idade igual ou superior a 65 anos, um aumento de 7,62% em relação ao ano anterior.

Celso Grisi, diretor-presidente da Fractal Instituto de Pesquisas, explica que setores como educação, construção civil e até informática justificam tais contratações por conta da demanda de mão de obra capacitada.

“A area de educação, por exemplo, precisa de professores que tenham experiência e didática, até mesmo por conta do número imenso de novas universidades. Na construçao civil, temos sentido nivel de demanda de engenheiros para edificação e também de técnicos. Há ainda demanda por mestre de obras e, neste caso, numa faixa de mais velhos”, disse.

O comércio é outro setor que tem contratado trabalhadores mais experientes até por conta do atendimento, já que são mais pacientes por conta da aproximação do Natal, ressalta Grisi. E, na informática, não só por conta do segmento de vendas, mas também para programação, onde é exigido experiência e falta mão de obra qualificada. “Ao invés de buscarem pessoas novas, empresas têm contratado na faixa a partir dos 50 anos, passando por 65 até 70, em alguns casos”.

Conforme dados da Relação Anual de Informações Sociais (Rais) a maior parte* dos idosos atuou no ano de 2009  na Administração Pública (44,03%), seguido pelos setores de Serviços (30,51%), Indústria de Transformação (8,06%), Comércio (7,44%),  Construção Civil (4,24%), Agropecuária (4,20%), Serviço de Indústria de Utilidade Pública (1,12%), e Extrativa Mineral (0,40%).

Outra boa notícia é que todas as regiões do país registraram expressiva contratação de trabalhadores com mais de 65 anos. O destaque ficou com a região sudeste que, impulsionada pelo estado de São Paulo (87.390 postos), colocou 169.183 trabalhadores no mercado. Logo depois aparecem as regiões: nordeste (69.413), sul (41.902), centro-oeste (22.823) e norte (17.299).

Por Monyke Castilho e Silmara Cossolino

29 setembro 2010

Direito à cidade: uma ideia em construção

Segundo Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) de 2006, cerca de 83% dos brasileiros vivem em cidades.6 Esse “inchaço” dos centros urbanos é resultante de um modelo de desenvolvimento econômico que, desde o início do século 20 até hoje, vem diminuindo o emprego no campo e atraindo muita gente para as cidades em busca de melhores condições de vida. Isso ocorre no mundo inteiro, não só no Brasil.

Essa fuga para as cidades não foi acompanhada de políticas públicas que oferecessem aos seus habitantes a tão sonhada qualidade de vida. Viver nas grandes cidades, hoje, significa enfrentar poluição, congestionamento no trânsito, insegurança alimentar, violência, falta de saneamento e de moradia. O que as cidades oferecem em oportunidades, acabam por tirar em qualidade de vida. Pior ainda é o caso de grupos sociais mais pobres, em geral negros e indígenas.

No mundo inteiro as cidades têm problemas com habitação. Maiores ou menores, todas apresentam contrastes entre seus habitantes, marcados por desigualdades no acesso à moradia, educação, alimentação, trabalho, cultura, lazer e transporte. Esse cenário de desigualdades sociais é mais forte nos países em desenvolvimento como o Brasil. Em geral, a economia é organizada para conseguir
cada vez mais produtividade, eficiência e lucro (lógica máxima do capitalismo), que promova a construção de ruas, avenidas, edificações, carros e bens-consumíveis, e não se preocupa em atender as necessidades reais de seus habitantes e seus direitos humanos.

Desse modo, compreendemos por que as cidades se tornaram um dos principais locais das manifestações políticas e dos conflitos sociais; afinal, estes afligem diretamente a sociedade brasileira atual. Vejamos no quadro a seguir alguns tipos desses conflitos que, por sua vez, se apresentam de diversas formas: na intolerância e discriminação dos grupos mais frágeis da sociedade, a
exemplo do que ocorre em São Paulo com migrantes (nordestinos) e
imigrantes (bolivianos); em todo o Brasil, os homossexuais, as pessoas em situação de rua e as pessoas praticantes de religiões de matriz africanas entre outros; na repressão policial ao comércio ambulante (como camelôs); movimentos dos sem-teto com as ações de despejo violentas contra ocupações de imóveis (públicos e privados); aos jovens da periferia, negros, índios e outros; na falta de vagas nas creches, universidades públicas, leitos nos hospitais;
na total ausência de espaços públicos de convivência, lazer e de práticas desportivas e culturais, como praças, parques e bibliotecas nas periferias; nas longas distâncias entre o trabalho e a residência, falta de transporte público, e na escassez de infra-estrutura, água e luz, saneamento básico etc.

São vários conflitos, de natureza distinta, o resultado é uma sociedade cada vez mais dividida entre “incluídos” e “excluídos”. Não é por acaso que as cidades também se tornaram locais importantes na luta pela realização dos direitos humanos: a condição de vida urbana e as lutas sociais ocorridas nas cidades levaram à criação e conquista destes direitos ao longo dos tempos. Os direitos humanos também são chamados direitos da cidadania.

O que é o direito à cidade?

Nos últimos anos, tem crescido um movimento em todo o mundo pelo
reconhecimento do direito à cidade como direito humano fundamental. Podemos pensar que o direito à cidade é na verdade um direito de cidadania, uma vez que se articula com os demais direitos humanos. Todos os habitantes da cidade devem ter garantidos: seus Direitos Econômicos, Sociais, Culturais e Ambientais que permitam que as pessoas aproveitem as cidades com igualdade, dentro dos princípios de sustentabilidade e justiça social: acesso aos serviços públicos domiciliares e urbanos (saneamento, coleta de lixo etc.), transporte público e mobilidade urbana, moradia, educação, trabalho, cultura e lazer, informação, saúde, alimentação e meio ambiente; seus Direitos Civis e Políticos: liberdade de ação e organização (principalmente para os grupos mais vulneráveis), com respeito à variedade das culturas, que permitam às pessoas aproveitar seus direitos; poder viver sem discriminação de qualquer tipo, seja gênero, geração, raça, etnia, origem, linguagem, orientação sexual, política e religiosa,
preservando a memória e a identidade cultural.

As lutas por melhores condições de vida e trabalho ganharam força nos últimos anos, com o envolvimento de novos atores sociais: ONGs, movimentos populares, associações profissionais, pesquisadores, grupos religiosos, organizações políticas, entre outros.
Estes atores orientam suas ações para o desenvolvimento sustentável das cidades, de forma participativa, com igualdade social, respeito às diferenças e ao meio ambiente. Já surgiram algumas conquistas desta luta, com importantes documentos e cartas de princípios.

Destacamos alguns: o Tratado Por Cidades, Vilas e Povoados, Justos, Democráticos e Sustentáveis (1992), a Carta Europeia dos Direitos Humanos na Cidade (2000) e a Carta Mundial do Direito à Cidade (2005). Estes documentos querem influenciar as formas de governança (o modo de governar) das políticas globais, regionais e nacionais urbanas, de modo que sejam democráticas e revertam o quadro de desigualdade social nas cidades.

No Brasil, esse movimento se organizou sob a bandeira da reforma
urbana, e ganhou força desde a redemocratização brasileira, a partir de 1985.

Podemos destacar conquistas como o capítulo da política urbana na Constituição Brasileira, a promulgação do Estatuto das Cidades - Lei nº. 10.257 (2001) e a criação do Ministério das Cidades em 2003. Um dos protagonistas desse movimento foi o Fórum Nacional de Reforma Urbana, que reúne diversos atores do país na luta pelo direito à cidade.

Esta nova lei prevê a aplicação dos princípios das funções sociais da cidade e da propriedade: significa que as atividades econômicas e o direito à propriedade urbana devem atender em primeiro lugar às necessidades humanas, com base nos direitos humanos e a partir de processos participativos e democráticos, para depois atender aos interesses de mercado. Prevê também fortalecer a participação dos
municípios em políticas públicas que assegurem os direitos aos seus habitantes, com participação popular, inclusive dos setores que mais sofrem com desigualdade econômica e social. Alguns exemplos dessa nova forma de fazer política são os Conselhos e Conferências das cidades, além dos Orçamentos Participativos.

As novas leis significam esforços para criar instrumentos jurídicos e
políticos que promovam a transformação necessária das cidades brasileiras, possibilitando a humanização das relações sociais, minimização das desigualdades sociais e eliminação da segregação sócio-espacial.

Conflitos do direito à cidade

A maioria dos conflitos que vêm da luta pelo direito à cidade estão ligadas à moradia. Mas é importante lembrar que a cidade não é apenas um espaço para morar: é um espaço para viver, e isso inclui trabalho, saúde, transporte, lazer... ou seja, todas as dimensões de uma vida digna.

Portanto, precisamos ter uma política habitacional, onde os conjuntos
populares não sejam construídos apenas nas periferias, (longe do mercado de trabalho e com dificuldade de transporte público). Especialmente quando existem áreas e prédios vazios nas regiões centrais das cidades, devemos buscar “Revitalização do centro”, essa ideia que está tão na moda atualmente, não pode significar apenas prédios de fachadas bonitas, com ruas arborizadas, porém vazias.
É preciso trazer pessoas para morar no centro – inclusive as pessoas mais pobres, que tem menos dinheiro para gastar com necessidades básicas (por exemplo, com transporte), e que podem aproveitar melhor a estrutura e os serviços das regiões centrais (ônibus, escolas, postos de saúde, água e esgoto etc.).

Os processos de revitalização dos centros, na maioria das cidades
brasileiras, são normalmente um processo de “gentrificação”. O objetivo básico desse processo é valorizar os imóveis da região central, retirando a população mais pobre e tentando atrair as classes mais ricas e grandes empresas. Muitas pessoas a favor da “revitalização” querem acabar com o crime e remover a miséria nas partes centrais das cidades. O erro desta perspectiva é que, ao invés de resolver o problema (crime, drogas, miséria etc.), a gentrificação apenas expulsa a população mais pobre, para a periferia, para regiões de mananciais, margens de rios etc.

Um dos processos de gentrificação mais estudados na história do Brasil ocorreu no Rio de Janeiro, no começo do século XX, no governo do presidente Rodrigues Alves. Havia muitos cortiços e moradias miseráveis no Centro Velho do Rio, que se tornaram focos de doenças como febre amarela e peste bubônica. Para combater estas doenças, o governo resolveu demolir a maior parte dos cortiços, e a população pobre teve que passar a viver nos morros cariocas. Foi também nesse
período que ocorreu a Revolta da Vacina, quando a população reagiu contra a forma violenta e autoritária que o governo vinha empregando na implantação de seus programas de saúde.

Todos têm direito à cidade, desde o morador de rua até o grande empresário. Isso inclui também o direito a poder andar na rua sem medo de ser assaltado, um transporte público de qualidade, viver em espaços sem poluição e com acesso a lazer: seja futebol, teatro, shows, cinema ou parques.

Fonte: Material do Curso Direitos Humanos e Mediação de Conflitos

26 setembro 2010

Direito à Moradia!


Morar é tão essencial quanto comer, beber, vestir, respirar... É uma necessidade básica de todo ser humano. O jeito de morar, as características de uma casa, tudo pode mudar ao longo dos anos, mas ninguém vive sem um espaço onde morar. E não é só isso!

No Brasil, tanto nas cidades quanto no campo, nem todos têm uma casa adequada para viver com dignidade. Nas cidades, os que não podem pagar são obrigados a ir para a periferia, ocupar favelas, cortiços, margens de rios e represas, ou outrasáreas de risco. Vivem em moradias precárias, em áreas deterioradas da cidade. Falta água limpa, sistema de esgoto, asfalto nas ruas etc. No campo, muitas casas não têm infra-estrutura básica e são focos de doenças como chagas, dengue, diarreia, hepatite A etc. Quem não tem terra para plantar não pode prove o sustento da família, sendo obrigados a tentar a sorte nas grandes cidades.

Para grande parte do povo brasileiro, infelizmente, moradia ainda é sinônimo de carência: falta água encanada, luz elétrica e saneamento básico. São milhões de pessoas sem teto ou morando em habitações precárias no Brasil, e a falta de moradia é um sério problema a ser enfrentado. Ao mesmo tempo em que faltam casas e apartamentos, estima-se que 5 milhões de residências estejam fechadas, sem uso ou vazias. Em São Paulo, a maior cidade do Brasil, fica claro que o problema habitacional é muito grave. A Folha de S. Paulo (04.06.2000), fala que, no ano 2000, metade da população do município de São Paulo (ou seja, cerca de cinco milhões e quinhentas mil pessoas) morava “em loteamentos ilegais, cortiços ou favelas, a maioria sem infra-estrutura básica”.

Segundo o jornal O Globo (16.05.2004), no município do Rio de Janeiro, em 2000, havia cerca de um milhão e cem mil pessoas, 19% da população, morando precariamente em favelas, de acordo com os dados do IBGE. O fenômeno não é exclusivo dessas duas grandes cidades: em outra matéria publicada no mesmo jornal (14.11.2003), o então ministro das Cidades “revelou que 85% dos municípios brasileiros têm favelas ou outras formas de moradia em condições precárias. É certo que haja variação de números ao longo do território nacional, mas o mesmo órgão federal considera o déficit habitacional atualmente na ordem de seis milhões e seiscentas mil unidades”.3 Em outras palavras, o Brasil precisaria de pelo menos seis milhões e seiscentas mil casas ou apartamentos para resolver os problemas de moradia do povo.

Uma questão para reflexão: por que, no Brasil, esse fato atinge mais diretamente os pobres, negros e indígenas?

Todas as pessoas têm direito a uma vida digna, para si e sua família. Isso não é possível sem garantir os direitos humanos, inclusive o direito à moradia, à terra e à cidade. Como sobreviver sem um abrigo, um teto, um pedaço de terra para morar? Nenhum ser humano pode viver dignamente sem uma  moradia.

Mas não são poucos os que “não moram”. Pessoas ainda perambulam pelas ruas, noite e dia, revirando latas e sacos de lixo para comer o que estiver “dando sopa”; dormem embaixo de viadutos, em praças, albergues ou ao relento! A maioria passa longe dos financiamentos de compra da sonhada casa própria, pois não tem como comprovar renda. Barracos à beira de esgotos abertos, camas de papelão sob viadutos e refúgio em cortiços são soluções precárias para os problemas desta população que não tem teto e vive nas ruas. Há 620 mil pessoas nessas condições só na grande São Paulo. A população de rua, ou “em situação de rua”, como são tecnicamente chamados, é uma das populações mais vulneráveis da sociedade, ou seja, é uma das vítimas mais freqüentes de violações de direitos humanos.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos diz que “toda pessoa tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar a si e a sua família, saúde e bemestar, inclusive alimentação, vestuário, habitação”.

O direito à moradia digna é um direito social importante, conquistado através de muita luta, promovida por movimentos populares organizados, e hoje está previsto no artigo 6º da Constituição Federal.

Artigo 6 - São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.

Não se trata apenas do espaço de moradia em si. Mas de um mínimo de qualidade e conforto que as casas precisam oferecer como infra-estrutura básica;(água, esgoto, energia elétrica e drenagem); acesso a transporte coletivo (ônibus, metrô e trens) e aos equipamentos sociais (saúde, educação, segurança, lazer e cultura), como postos de saúde, hospitais, creches, escolas, postos de polícia, bombeiros, parques, teatros etc. O direito à moradia não se resume apenas à presença de um abrigo ou teto, mas significa ter acesso a uma habitação adequada, que possua infra-estrutura básica e, portanto, que ofereça aos moradores uma possibilidade de melhoria contínua de suas condições de vida.


Como dissemos, a moradia é mais do que um teto sobre a cabeça. Quando se fala de habitação “adequada”, estamos falando de vários outros aspectos que devem fazer parte de uma moradia digna.

O respeito ao direito à habitação adequada é uma forma de garantir os demais direitos econômicos e sociais. A cada dia, ressalta-se a urgência de uma política habitacional como instrumento insubstituível de inclusão social e melhoria da qualidade de vida dos cidadãos. É uma concreta afirmação de cidadania a fim de possibilitar o acesso a uma vida mais saudável, segura e feliz, a todos os brasileiros.

Vejamos a seguir algumas das características essenciais de uma Habitação Adequada, de acordo com o Pacto de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (1991)5:

SEGURANÇA LEGAL DE POSSE

Trata-se de uma garantia de que a pessoa não vai perder a casa de repente, seja por um despejo forçado ou outras ameaças. Tem de ser algum tipo de documento que comprove que o morador tem o direito de viver onde está. Existem várias formas de formalizar a “posse” do imóvel, seja aluguel (público ou privado) da acomodação, habitação cooperativa, arrendamento, uso pelo próprio proprietário, habitação de emergência e assentamentos informais, incluindo ocupação de terreno ou propriedade.

DISPONIBILIDADE DE SERVIÇOS, MATERIAIS, FACILIDADES E INFRAESTRUTURA

Uma casa adequada deve oferecer condições básicas de saúde, segurança, conforto e nutrição. Para ter acesso completo ao direito à habitação adequada, as pessoas devem ter acesso sempre a recursos naturais e comuns, como água potável, energia e gás para cozinhar, iluminação, esgoto tratado, recolhimento de lixo e serviços de emergência, como polícia, bombeiros e atendimento médico de urgência. Isso inclui também relógios de água e luz, com contas separadas por casa.

CUSTO ACESSÍVEL

Uma moradia sempre tem custos para ser mantida. Mas este custo não pode ser alto demais, pois torna muito difícil para as famílias realizarem as suas outras necessidades básicas – como alimentação, roupa, transporte etc. Portanto, os gastos obrigatórios com a moradia têm de estar de acordo com a renda da família, e os governos precisam pensar em alguma outra forma de ajuda (subsídios, bolsas ou outros) para apoiar as famílias que não tenham renda o suficiente.

HABITABILIDADE

Uma habitação adequada significa dar um espaço adequado para cada morador, ao mesmo tempo em que é resistente, protege as pessoas do frio, umidade, calor, chuva, vento ou outras ameaças à saúde (contra o barbeiro da Doença de Chagas, ou o mosquito da Dengue). Moradias ruins (ou insalubres, como são chamadas) são causa de vários problemas de saúde.

ACESSIBILIDADE

Não basta ter uma moradia, mas a moradia precisa ser adequada às pessoas que possam viver nela. Grupos como idosos, crianças, deficientes físicos, doentes terminais, portadores de HIV, pessoas com transtornos mentais ou problemas crônicos de saúde, entre outros, possuem necessidades específicas, e as casas precisam ser construídas pensando nestas pessoas. Por exemplo, uma pessoa com deficiência física e um idoso têm muita dificuldade em subir escadas – portanto as casas devem ter rampas, e os edifícios precisam ter elevadores. O Decreto de Acessibilidade - http://www.mj.gov.br/sedh/ct/CORDE/dpdh/sicorde/dec5296.asp - é um progresso importante, mas temos de exigir que as leis não fiquem apenas no papel. As populações mais vulneráveis (que sofrem mais para realizar seus direitos) têm direito à atendimento prioritário, e na habitação isso não pode ser diferente , é preciso pensar nessa parcela da população no momento da construção das casas e edifícios.

LOCALIZAÇÃO

Não basta ter uma moradia, especialmente se ela ficar longe de tudo: longe do trabalho, da escola das crianças, do posto de saúde ou do comércio. A habitação adequada deve ficar em um local com serviços de saúde, escolas, creches, lazer e opções de trabalho. Isso é válido tanto para grandes cidades quanto para o campo. Da mesa forma, habitações não podem ser construídas nas proximidades de fontes de poluição, locais insalubres (lixões), que ameacem à saúde das pessoas, nem tampouco em áreas de mananciais, quer dizer, às margens dos rios e das represas.

ADEQUAÇÃO CULTURAL

As pessoas têm o direito de se identificar com a casa onde vão morar – inclusive com o seu desenho, materiais de construção e a forma com que a casa for construída. Assim, as políticas habitacionais devem levar em conta a identidade e diversidade cultural da população que vai ser atendida. Um passo importante para isso é que as políticas sejam construídas ouvindo e contando com a participação do povo. Novas tecnologias e técnicas de desenvolvimento e modernização devem ser utilizadas, mas não podem prejudicar as características culturais dos moradores.

Nesse caso, os povos indígenas e os moradores das comunidades quilombolas podem optar, ou não, por manter sua cultura.

O direito à moradia está no centro de vários conflitos nas grandes cidades de hoje. Os casos mais conhecidos são as lutas dos movimentos sem-teto, com as ocupações de prédios vazios nas regiões centrais. Enquanto o déficit habitacional brasileiro é da ordem de sete milhões de moradias rurais e urbanas – ou seja, o Brasil precisa construir sete milhões de casas ou apartamentos para resolver o problema de moradia do seu povo – existem cerca de cinco milhões de unidades habitacionais vazias no país (números do Fórum Nacional pela Reforma Urbana).

Muitos dos prédios vazios têm dívidas enormes com o governo (como pagamento de IPTU), e outros servem apenas à especulação imobiliária – ou seja, ficam vazios,
esperando que os preços dos imóveis subam, para que os donos possam lucrar com
sua venda sem ter que alugar ou reformar.

Os movimentos de moradia lutam contra isso, e fazem as ocupações de edifícios para forçar a venda e reforma dos prédios vazios como forma de habitação popular. Segundo os donos dos prédios, as ocupações (ou “invasões”, como eles e a imprensa gostam de chamar) são uma violação do direito à propriedade deles.

Esse argumento também é utilizado por donos de latifúndios para impedir desapropriações para a Reforma Agrária, de que eles teriam o direito de fazer o que bem entendessem com suas propriedades. E é com base nesse argumento que a
Justiça determina muitas vezes a “reintegração de posse” de um prédio ocupado, quando os movimentos têm que sair dos prédios ocupados. As ações de “reintegração de posse” são de despejo das pessoas que estão morando ali, e quase sempre ocorre violência por parte das polícias militares que executam o
despejo. Contra o argumento do direito à propriedade, as leis brasileiras, tanto para as cidades quanto para o campo, hoje dizem que toda propriedade tem que cumprir sua “função social”. Por exemplo, um edifício vazio não está cumprindo seu papel, que seria dar espaço para as pessoas morarem ou trabalharem. No caso do campo, uma fazenda improdutiva, que não tem gado, não planta etc., também não está cumprindo sua função social. Ainda assim, o movimento de moradia continua enfrentando despejos violentos, e os processos de desapropriação e requalificação (reforma para moradia popular) são muito lentos.

OBS: Texto referente curso Direitos Humanos e Mediação de Conflitos - à distância 

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