Identificar o problema, encarar a situação, ter uma iniciativa assertiva e
manter uma postura confiante para se sobressair em meio às dificuldades são
alguns dos comportamentos pertinentes ao profissional resiliente. Dessa forma,
a atitude dele em relação às adversidades é que vai fazer a diferença para o
seu sucesso na resolução do problema.
De acordo com Ricardo Piovan, consultor organizacional, palestrante e autor do
livro "Resiliência - Como superar pressões e adversidades no
trabalho", lançado recentemente, o departamento de Recursos Humanos tem um
papel fundamental no processo de resiliência nas organizações. "É sua
missão proporcionar o desenvolvimento desta habilidade nos colaboradores das
empresas, seja através de treinamentos, palestras ou leitura de livros",
comenta. Em entrevista ao RH.com.br, Piovan também apresenta os princípios para
o desenvolvimento do comportamento resiliente. Aproveite para refletir acerca
do assunto e faça uma boa leitura!
RH.COM.BR - O que
significa resiliência nas organizações?
Ricardo Piovan - Antes de definirmos resiliência nas
organizações vamos falar sobre o conceito de resiliência. Esta palavra ainda
nova para os ambientes corporativos originou-se na física, sendo a propriedade
que alguns materiais têm de acumular energia, quando submetidos a um esforço e,
cessado o esforço, retoma ao seu estado natural, sem sofrer deformações
permanentes. Veja o caso de uma vara utilizada no salto de altura: quando o
atleta toma impulso para saltar, a vara curva-se, acumula energia, projeta o
atleta sobre o obstáculo e depois retorna ao seu estado normal sem deformações.
A psicologia tomou emprestado este termo para definir pessoas que sofrem
pressões e adversidades e mesmo assim conseguem manter-se em um estado normal,
não se permitindo "quebrar" diante de tantos problemas e desafios do
dia moderno.
Em minhas definições vou um pouco mais longe neste processo. Defendo que
pessoas resilientes são aquelas que sofrem crises, enfrentam mudanças ou
situações de forte estresse e conseguem "dar a volta por cima",
transformando sofrimento em competência.
Agora se lembre de quanta pressão, adversidades, desafios e busca de resultados
sofremos no nosso dia a dia no ambiente corporativo. Tudo isto aliado a um
chefe autoritário e confuso. Muitas pessoas iniciam um processo de quebra, não
aguentando tanto estresse. Uma pesquisa da International Stress Management
Association (ISMA), entidade presente em vários países, demonstra que 82% dos
profissionais brasileiros apresentam ansiedade em vários graus, como: dores
musculares, sentidas em 96% dos entrevistados; angústia, por 78%; momentos de
agressividade, em 52%; e problemas gastrointestinais, em 32%. Esses números
evidenciam que os profissionais brasileiros necessitam desenvolver a habilidade
da resiliência; isto é, sofrer pressões e adversidades, pois elas são
inevitáveis, e mesmo assim continuar a dar resultados positivos, ficando em seu
estado normal.
RH - Qual o perfil
do profissional que apresenta tal competência?
Ricardo Piovan - Um dos perfis que acredito ser de
grande valia vem de encontro com a emblemática frase de Kelly Young "o problema não é o problema, o problema é a
atitude em relação ao problema". Minha leitura em relação a
esta afirmação de Young é que a pessoa resiliente tem consciência de que sua
vida será uma sequência de altos e baixos, uma verdadeira montanha russa onde
existirão momentos de sucesso e êxtase, mas haverá momentos difíceis onde as
dificuldades apareceram; tudo isto, tanto na vida profissional quanto na vida
pessoal.
O que difere o profissional resiliente do não resiliente são as atitudes em
relação aos problemas, a atitude em relação aos vales da montanha russa. A
principal característica deste profissional é a ação assertiva. Ele não foca no
problema, e sim na solução dele. Pessoas sem esta competência tendem a ficar
com raiva da adversidade, impedindo enxergar as possíveis soluções e outras
pessoas tendem a entrar na tristeza ou no medo, sentimentos que paralisa a
ação. O profissional resiliente não permite entrar nestes sentimentos e com
isto toma decisões e parte para a ação.
RH - Qual a
importância da resiliência no mundo organizacional?
Ricardo Piovan - A palavra de ordem nas empresas hoje é
resultado e na maioria dos casos resultado é fazer "mais com menos".
Hoje o profissional tem que ser polivalente, cobrar o escanteio, correr e fazer
o gol de bicicleta. São várias as reuniões que participo no qual temos que
apresentar o andamento de algumas metas que foram estabelecidas e ao final da
reunião temos duas ou mais metas estabelecidas para serem cumpridas. Agora alie
tudo isso à crise global que estamos vivendo; é muita pressão e adversidade
junta e o profissional tem que se manter inteiro, continuando a dar resultados
positivos.
RH - Há algum
recurso que auxilie o desenvolvimento da resiliência nas pessoas?
Ricardo Piovan - No livro apresento vários recursos,
nos quais chamo de princípios, para a pessoa tornar-se mais resiliente. Uma
delas é muito simples e prática, trata-se da consciência do sequestro da
amídala.
Quantas vezes em nossos ambientes de trabalho já tivemos reações impulsivas das
quais nos arrependemos depois? Seja pedindo demissão após um feedback ofensivo de um gestor ou uma discussão
nada produtiva, que passa dos limites, em uma reunião, desmotivando totalmente
nossa equipe. Em muitos momentos nos falta a tão famosa, mas pouco utilizada,
inteligência emocional. De acordo com Daniel Golleman, há uma explicação
neurológica para esse comportamento agressivo, mediante situações
desagradáveis. O cérebro humano foi formado de baixo para cima, isto é, as
primeiras estruturas do cérebro iniciam na parte de baixo e com a evolução
outras ramificações foram formadas até chegar ao topo da cabeça. Os homens das
cavernas tinham apenas a parte inferior formada e nela há uma estrutura pequena
chamada amídala, onde ficam armazenadas nossas emoções boas e ruins. Assim que
nossos antepassados ouviam ou viam algo, esta informação era enviada à amídala
que determinava a reação dele. Ou seja, se aparece um animal, a amídala dava a
ordem: "Fuja"
ou "Ataque-o";
a amídala dava uma ordem emocional, por impulso, sem questionar muito a
situação.
RH - E em relação
ao homem moderno, o que muda?
Ricardo Piovan - Já o homem moderno, além de ter a
amídala, também possui uma estrutura próxima à testa chamada neocortex que
comanda nossas ações racionais, é a parte pensante do cérebro, isto é,
questiona e pensa a melhor forma de executar alguma tarefa. Segundo Golleman, o
problema é que a informação chega primeiro à amídala e apenas depois chega ao
neocortex. Portanto, se o que está acontecendo no ambiente externo é muito
intenso, a amídala pode dar o comando de "Fuja" ou "Ataque" antes que o neocortex diga "calma, vamos montar um plano de ação para
resolver este problema mais assertivamente". Este processo
chama-se "sequestro da amídala", onde ela não permite que o neocotex
aja. Acredito que uma pessoa resiliente consegue desativar o sequestro da
amídala, não permitindo reações impulsivas, elas fazem aquele famoso
"contar até dez", para que a informação chegue ao neocortex e seja
processada racionalmente, não permitindo assim cometer excessos que fatalmente
serão catastróficos para uma solução eficaz. Eistein já dizia: "um problema não pode ser resolvido no mesmo
estado emocional que ele foi criado ou descoberto".
RH - De que forma
a resiliência pode ser trabalhada no ambiente corporativo, em meio à
instabilidade econômica que atinge cada vez mais as organizações?
Ricardo Piovan - Como diz a música de Lulu Santos
"na vida tudo passa, tudo
sempre passará, a vinda vem em ondas como mar...". A simples
consciência dessa frase, aliada a muito trabalho assertivo, já é suficiente
para passar por esta fase. Veja a história dos Estados Unidos: uma grande
depressão econômica em 1929. Findo este processo, um grande crescimento; nova
crise do petróleo em 1981, mais um grande processo de crescimento e 2008, mais
uma crise.
RH - Qual o papel
do profissional de RH para o desenvolvimento da resiliência no ambiente
corporativo?
Ricardo Piovan - O profissional de RH tem um papel
fundamental neste processo. É sua missão proporcionar o desenvolvimento desta
habilidade nos colaboradores das empresas, seja através de treinamentos,
palestras ou leitura de livros. Estes profissionais devem introduzir a
resiliência no hall de competências a serem desenvolvidas pelos funcionários
das organizações. Note que em todo momento temos medo, tristeza e raiva,
gerando paralisações nas tomadas de decisões ou atitudes impeditivas que nos
arrependemos depois. Portanto, buscar o equilíbrio emocional para estes momentos
é fundamental para o sucesso do funcionário e consequentemente da empresa.
RH - No livro
"Resiliência - Como superar pressões e adversidades no trabalho",
lançado recentemente, o Sr. destaca fatores para o desenvolvimento do
comportamento resiliente. Quais seriam esses princípios?
Ricardo Piovan - Vamos na sequência: ter consciência de
que dificuldades fazem parte da vida e é preciso conviver com elas; compreender
a natureza humana e buscar o contato com seu Eu Superior; persistir lutando
para superar as adversidades; encarar o problema, tomar as decisões necessárias
e investir energia para solucioná-lo, e por fim, entender que as dificuldades
da vida nos tiram da zona de conforto e proporcionam crescimento.
RH - Quais as
possíveis adversidades que o profissional encontrará para a execução desses
princípios?
Ricardo Piovan - A principal adversidade é a não
consciência dos comportamentos limitantes. De acordo com Freud e Young, o ser
humano, em média, consegue observar e controlar apenas 10% do seu comportamento,
sendo que 90% está submerso no inconsciente, impossibilitando que ele visualize
seus pontos de melhoria. No primeiro princípio do livro eu divido as pessoas em
reativas, submissas e proativos e possibilito ao leitor fazer um teste para se
enquadrar em uma das pessoas. Quando o teste mostra que ela é reativa - um
comportamento de pessoas nada resilientes -, por exemplo, as pessoas começam a
contestar o teste, dizendo que não tem fundamento, questionando cada um dos
dados. Pois bem, só este comportamento agressivo já demonstra por si só que a
pessoa é reativa, mas ela não percebe, ela nega este comportamento e com esta
negação não há o processo de desenvolvimento para uma pessoa proativa.
Neste caso, sugerimos que a pessoa deixe o resultado em stand
by e converse com
pessoas ligadas ao seu convívio e questione com eles cada questão do teste,
objetivando a conscientização do comportamento limitante. Uma frase de um autor
desconhecido diz "Deus nos
fez de um modo que não vemos nossas costas, aos outros está reservado vê-las,
portanto leve em consideração o que eles veem". As outras
pessoas veem os nossos 90%.
RH - Ao elaborar
essa obra, qual foi o seu principal objetivo?
Ricardo Piovan - O principal objetivo foi demonstrar
que a resiliência não é uma característica reservada a seres humanos
privilegiados. A resiliência é uma habilidade e, como tal, pode ser aprendida e
desenvolvida por qualquer um de nós. Através da consciência de comportamentos
limitantes existentes em cada ser humano é possível passar por um processo de
transformação e incorporar a resiliência na nossa vida profissional e pessoal.
RH - Qual foi o
público-alvo do seu trabalho?
Ricardo Piovan - Procurei direcionar o trabalho para o
ambiente corporativo em geral, tanto para empregadores como empregados ou
profissionais liberais, pois como convivo com esse público diariamente, percebi
a necessidade de iniciar um processo de conscientização de que podemos passar
por pressões e adversidades com desgastes menores do que temos hoje. Mas como
digo em minhas palestras comportamentos são repetitivos.
Portanto, não tenha dúvida que a pessoa que não tem resiliência no trabalho
também não tem resiliência na sua vida pessoal; logo, um processo de
transformação no trabalho traz benefícios para a vida pessoal também, pois o
ser humano é integral.
RH - Que conselhos
o Sr. daria a quem busca desenvolver a resiliência, mas sente dificuldades?
Ricardo Piovan - Resiliência está ligada a
comportamentos, e estes se melhoraram através da conscientização de atitudes
limitantes, conforme já falamos. Existem várias formas de buscar a revisão
comportamental que vai desde um auxílio psicológico, em caso extremo, até a
participação em treinamentos de focam os comportamentos humanos. O feedback é outra ferramenta importantíssima
neste processo. Empresas que aplicamos treinamentos de feedbacks 360º melhoram profundamente a
resiliência, pois todas as pessoas contribuem para o aperfeiçoamento
comportamental do outro. Para fechar, me lembrei de uma frase de Peter Drucker:
"As pessoas são contratadas
pelas suas habilidades técnicas, mas são demitidas pelos seus comportamentos".
Portanto, nada mais justo do que buscarmos o conhecimento para sermos mais
resilientes.
Por Élida Bezerra para o RH.com.br
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