No meio do caminho tinha uma pedra
“Nomeio do caminho tinha uma pedra
Tinha uma pedra no meio do caminho
Tinha uma pedra
No meio do caminho tinha uma pedra”.
(Carlos Drumond de Andrade)
São inúmeras as “pedras no meio
do caminho” da trajetória política brasileira. As “retinas fatigadas” de todo
cidadão que acompanha minimamente o comportamento e as decisões políticas bem
sabem quais são essas pedras. Aparecem como verdadeiros fantasmas difíceis de
exorcizar. Ou como entraves históricos e estruturais que facilmente são
naturalizados como coisas do dia-a-dia. Os cientistas sociais, com destaque
para Celso Furtado ou Florestan Fernandes, não se cansam de apontar sua
existência e persistência.
Entre tais fantasmas ou
entraves, não custa sublinhar alguns: juros altos, inflação recorrente, carga
tributária das mais pesadas do planeta, endividamento crônico e a velha
dependência do mercado internacional. Mas faltaria ainda assinalar o nepotismo,
o centralismo, o populismo personalista, o coronelismo, para não falar de
outros “ismos” que, como chagas purulentas vão corroendo o tecido social e
fazendo desacreditar dos contratos e promessas políticas. Em meio a esse
terreno minado, os mandatos como que vão passando de pai para filho, numa
disputa ferrenha no interior das classes dominantes pelos cargos públicos.
No decorrer dos séculos, sem
exceção das últimas décadas, tropeçamos nessas pedras com uma frequência que as
torna normais ou “naturais”. É natural que um político, seja ele deputado ou
senador, ministro ou juiz da mais alta corte, tenha seu patrimônio multiplicado
por cinco, dez ou vinte vezes. Com Antonio Palocci, Ministro da Casa civil, as
coisas não são diferentes. Naturaliza-se seu rápido enriquecimento com o
argumento de que “vários políticos fazem a mesma coisa”. Ao invés de combater o
pecado, justifica-se o pecador com a alegação de que ele é “apenas mais um”
entre tantos outros. Generaliza-se para encobrir o erro. Aplica-se aqui o
conceito de patrimonialismo de
Raymundo Faoro.
Não precisa ser economista nem falar o
economês para saber quem paga a conta ou quem vai desatar esses nós da política
brasileira. “A corda sempre rebenta do lado mais fraco”, diz com razão o ditado
popular. Um exemplo basta como comprovante: para produzir, os empresários pagam
juros vultosos; mas, para consumir, os juros que pagam os cidadãos são mais
elevados ainda, muito mais elevados! Prova disso está nos juros do cartão de
crédito, dos empréstimos bancários ou do cheque especial. Sem falar que os
custos de produção acabam sendo irremediavelmente repassados para a ponta da
cadeia mercantil, que é o consumidor.
Por trás desse processo de
economia míope e por trás da carga tributária, encontram-se os gastos
estratosféricos e progressivos da máquina governamental, seja ela em nível
federal, estadual ou municipal. No interior dessas máquinas mora um vírus que
resiste a todo tipo de vacina. Quase impossível erradicá-lo! Uma verdadeira
praga que mantém intocável os privilégios da Casa Grande, bem como a cultura da
corrupção, do corporativismo e da apropriação privada da rex pública. “Aos companheiros da base governista, tudo; aos
outros, a lei”!
Entra governo e sai governo,
mas a chaga permanece. Daí a dificuldade de o Congresso Nacional aprovar
qualquer projeto que mexa nos benefícios das classes dominantes e tente uma
melhor distribuição de renda e riqueza. Dificuldade que contrasta frontalmente
com a facilidade de aprovar o aumento para os representantes dos três poderes.
Em semelhante quadro, não seria exagero falar de certa promiscuidade entre o
Executivo, o Legislativo e o Judiciário. Quando convém, um protege e legitima o
outro; quando não, todos se unem para expor, fritar e linchar politicamente
determinado “bode expiatório”. Assim se resolvem os escândalos: frente à
estridência denunciatória da mídia, da OAB ou da CNBB, por exemplo, basta
enviar algum político medíocre para o patíbulo, e tudo está resolvido. “Melhor
que um só morra por todos”! E essa prática diferenciada da justiça acaba
comprando o silêncio do público.
Quanto ao cidadão, segue
pagando as despesas, não raro descontadas na fonte. E sabendo que será
irrisório o retorno em bens públicos. Juros e impostos nem sempre se convertem
em melhorias sociais. Ao contrário, parece haver aí uma proporção inversa e
perversa: quanto mais se paga, menos se
pode desfrutar dos progressos relativos à saúde, educação, moradia,
transportes, segurança, lazer... A tal ponto que a pergunta é inevitável: para
onde vão os tributos que, em média, chegam a 40% de tudo o que se produz, se
compra e vende e se consome? O cidadão consciente não pode deixar de refletir
sobre essa questão!
Pe.Alfredinho
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